Cesar Ibrahim é Mestre em Psicologia pela Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro, com formação psicanalítica. Iniciou a
atividade clínica em 1984, com o atendimento de adultos e adolescentes,
ampliando o trabalho para a psicoterapia de família. Seu foco é compreender as dificuldades enfrentadas pelos
educadores na maneira de conduzir a formação de pessoas, que devem ser capazes
de se constituir psiquicamente de forma autônoma. Além disso, trabalha com
adolescentes para mostrá-los que a vida também é feita de frustrações.
Sua rotina de trabalho inclui atendimento clínico e também
atendimento a grupos de crianças e adolescentes. Que tipo de questão é abordada
nesses grupos? Como funciona a dinâmica?
Eu trabalho com crianças, adolescentes e jovens em atividade
clínica, e a prevalência é de atendimento em grupos entre seis e sete pessoas.
Abordamos, principalmente, a questão universal dos adolescentes, que é a
dificuldade de crescer e de avançar no desenvolvimento emocional, além de
assumir as exigências que o mundo vai, pouco a pouco, impondo. Procuro mostrar
os caminhos que façam com que os jovens percebam e entendam que certas etapas
de acontecimentos da vida, como o fracasso e a decepção, são importantes para o
amadurecimento de todos. A resistência é grande, pois minha ideia é mostrar
exatamente o inverso do que eles vivenciam e são convencidos a acreditar, que é
o conceito de felicidade e alegria apenas, sem frustrações nem tristeza.
Exerço um trabalho clínico dentro do consultório
e participo também de atividades em universidades, com educadores, terapeutas e
profissionais que lidam com crianças e adolescentes.
Eventualmente trabalho com escolas, com profissionais de educação, no sentido
de contribuir para o desenvolvimento emocional do aluno. Abordamos qual é o
papel da escola no psiquismo de crianças e adolescentes e na formação de seres
humanos menos suscetíveis a impressões e influências impostas pela cultura do
Século 21. Uma cultura que exacerba a fantasia de uma vida excepcionalmente
feliz, alegre, agitada e indolor. É isso que nós encontramos no mundo adulto,
na farmácia, por exemplo, onde há cura de tudo: da insônia, da tristeza, da
depressão, da ansiedade; além de todas aquelas vitaminas que se dá para a
criança, como se fossem uma solução para todos os males existentes.
Temos, hoje, muitos problemas na formação de crianças
decorrentes do consumismo, incentivado em nossa sociedade de diversas formas. O
consumo é um assunto relevante nesses grupos que você atende?
Que impacto essa preocupação excessiva dos pais com o
fornecimento do prazer aos filhos pode ter no desenvolvimento infantil?
De maneira geral, essa marca da cultura está diretamente
ligada ao imediatismo do prazer, e é claro que isso vai se desdobrar na relação
com o consumo. O desejo tende a ser satisfeito sob essa forma materializada,
que tem um movimento compulsivo – já que, na verdade, ela é insaciável. O
jovem, que troca o tempo todo de objeto de desejo, no fundo persegue essa
fantasia idealizada de que haverá uma forma de obter o prazer quase sempre com
caráter imediato, e como se isso pudesse compor essa pseudo-felicidade, aquela
que os pais esperam para os filhos. O processo funciona como se fosse uma
missão que os pais atribuem a eles mesmos para proporcionar uma existência
quase analgésica aos filhos, ou seja, uma existência indolor, que não inclua a
frustração. O que podemos ver, a partir dessa marca da cultura hegemônica
hedonista, é essa tentativa dos pais de injetar uma espécie de anestésico
existencial. Seria uma espécie de blindagem emocional comprometida com o prazer
o tempo inteiro.
Ainda sobre a preocupação dos pais com a alegria dos filhos,
você pode dar exemplos dessa relação entre a busca da felicidade e o consumo?
Um exemplo bastante freqüente é a vontade de trocar de
celular, comprar um iPhone, novos produtos eletroeletrônicos ou qualquer outro
objeto de consumo. Essa vontade se coloca a serviço dessa ideologia, a princípio
muito bem intencionada dos pais, que querem promover a felicidade dos filhos.
Eles não sabem como e nem o que fazer, mas acreditam que, se puderem fazer com
que os filhos atravessem uma infância e uma adolescência sem dor e sem esforço,
a missão está cumprida. No fundo, sabemos que é exatamente o contrário. Para
crescer tem que frustrar. Portanto, eventualmente, o desejo deve, sim, ser
barrado. Sobre esse assunto, temos tanto o ponto de vista material quanto o
ponto de vista emocional, amoroso. Grande parte dos adolescentes se depara com
aquela situação típica de vida escolar, que é: o meu objeto amoroso não me
quer. E assim se deflagra a relação do sujeito com a inevitabilidade da dor.
Na sua opinião, existe, no ambiente escolar, uma preocupação
em ensinar a lidar com o fracasso?
A escola está cada vez mais articulada nessa necessidade de
frustrar, principalmente pela recorrência desse assunto. Existe o
comprometimento de mostrar que a vida acadêmica dá trabalho e, por isso, exige
muita dedicação e renúncia ao prazer imediato, por exemplo. Freud ressaltava
muito a importância de a pessoa renunciar o movimento na direção do desejo para
poder crescer. Nesse sentido, é preciso mostrar ao jovem que é a renúncia que
fortalece e que projeta o ser humano para o seu desenvolvimento. E que o
contrário também é verdade – essa fantasia de que a satisfação plena entorpece
e paralisa é cada vez mais comprovada clinicamente.
Em seu trabalho nas escolas
existe também a questão da inserção, de que o jovem quer se sentir parte de
algum grupo e acredita que a posse de bens ou o comportamento pode influenciar
nisso?
Os meios de comunicação, principalmente a televisão, exercem
um papel importante nas questões ligadas ao consumismo. Qual é a influência da
mídia nessas questões?
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